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GARANTIAS LOCATÍCIAS

São obrigações acessórias que seguem a principal, qual seja, a locação,[i] as garantias foram previstas e regulamentadas pelo legislador na tentativa de reduzir eventual inadimplemento de aluguel e encargos do locatário[ii]. Elencada no artigo 37 da Lei nº 8.245/91, lei de locações, apresenta quatro modalidades:

Art. 37. No contrato de locação, pode o locador exigir do locatário as seguintes modalidades de garantia:

I – caução;

II – fiança;

III – seguro de fiança locatícia.

IV – cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento.

Desse modo, confira abaixo uma breve análise das modalidades de garantia locatícia:

 1 – CAUÇÃO:

A garantia ocorre através de bens móveis ou imóveis, a caução é uma garantia locatícia considerada gênero, na qual abriga várias espécies, a saber:

  • Caução de bem móvel:

Prevista no artigo 38, parágrafo primeiro, da Lei 8.245/91, determina que a caução em bens móveis deve ser registrada em cartório de títulos e documentos.

Sinceramente, esta espécie de caução não é a mais segura e indicada para o locador, vez que o locatário ficará na posse do bem, podendo o mesmo alienar (vender) sem comunicar ao locador. Ex.: maquinário, joias, computador, carro, este último pode ser envolvido em acidente e ter perda total e o locador nem ficar sabendo.

  • Caução em bem imóvel:

Prevista no art. 38, segunda parte do parágrafo primeiro, da Lei 8.245/91, determina que a garantia de bens imóveis deverá ser averbada à margem da matrícula do respectivo imóvel dado em garantia.

Esta espécie de caução, comumente chamada de caução imobiliária é mais segura que a caução de bem móvel, uma vez que o contrato de locação será averbado na matrícula do imóvel dado em garantia.

No entanto, não é uma garantia efetiva em caso de inadimplemento, vez que o imóvel do caucionante dado em garantia, se provado ser bem de família, não poderá ser penhorado para quitar os débitos do locatário, ressalta-se que o caucionante não é fiador e conforme recente decisão do Superior Tribunal de Justiça – STJ no Recurso Especial nº 1.873.203[iii], que consignou que esta caução imobiliária difere da fiança locatícia sendo vedada a interpretação extensiva da exceção da impenhorabilidade prevista no art. 3º, VII, da Lei 8.009/90[iv].

  • Caução em dinheiro:

Prevista no art. 38, parágrafo segundo, da Lei 8.245/91 que determina que o valor da caução em dinheiro não poderá exceder a três meses de aluguel, bem como deverá ser depositada em caderneta de poupança.

Esta espécie de caução exige que as partes (locador e locatário) abram uma conta poupança conjunta no nome de ambos, mas se o valor da caução em dinheiro for dado por um terceiro, denominado caucionante, a conta deverá ser aberta em nome do locador e do caucionante, que também deverá assinar o contrato de locação como caucionante. Ao final da locação, o valor deverá ser devolvido ao caucionante com os rendimentos da poupança.

Obs. 1: Caso haja aumento do valor do aluguel, o locador poderá exigir do locatário um complemento da caução para assegurar o valor dos três aluguéis.

Obs. 2: As partes podem ajustar no contrato que o valor dado como caução poderá ser utilizado para pagar os três últimos aluguéis, dessa forma, ao final da locação o locatário não receberá o valor de volta.

  • Caução em títulos e ações:

Prevista no art. 38, parágrafo terceiro, da Lei 8.245/91, é caução dada através de títulos de capitalização, títulos de crédito, títulos de dívida pública, cotas de sociedade empresarial, ações de companhias debêntures, letras de câmbio, e aqui o contrato também deve ser registrado no cartório de título e documentos. ainda, caso haja concordata, falência ou liquidação das sociedades emissoras desses créditos esta garantia caução deve ser substituída no prazo de 30 dias. Essa espécie de caução não é a mais usada nos contratos locatícios.

Observação em relação a caução: Se a caução for oferecida por uma terceira pessoa, esta assinará o contrato de locação como caucionante e não como fiadora.

 

 2 – FIANÇA:

Prevista no inciso II do artigo 37 da Lei de Locações esta é a garantia considerada a tradicional nos contratos de locações, em que uma terceira pessoa assume a obrigação principal do locatário, qual seja, o pagamento do aluguel em caso de inadimplemento. Em síntese, na fiança o fiador e seu patrimônio garantirão o adimplemento da obrigação principal.

Esta garantia é melhor que a garantia caução de bem móvel e imóvel, mas atualmente está cada vez mais difícil conseguir um fiador, vez que seu patrimônio poderá ser penhorado para garantir a dívida do locatário devedor, conforme entendimento do STF no Tema 295 é possível a penhora do bem de família do fiador, no mesmo sentido a Súmula 549 do STJ afirma ser válida a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação.

A fiança é regulamentada no Código Civil, especificamente nos artigos 818 a 839.

A fiança apresenta algumas particularidades como:

– A possibilidade do fiador exonerar-se (sair do papel de fiador) caso o contrato seja prorrogado por prazo indeterminado. No entanto, permanecerá responsável por 120 (cento e vinte) dias após a notificação ao locador (art. 40, inciso X, da Lei 8.245/91);

– Caso não haja limite da fiança, o fiador responderá além da obrigação principal também pelas acessórias como juros, multa, honorários e custas judiciais e demais gastos comprovados pelo locador para efetuar a cobrança.

– Em caso de fiador casado, exceto no regime de separação total de bens, se não tiver a autorização expressa do cônjuge, a fiança torna-se anulável, nos termos do artigo 1.649 do Código Civil.

 

3 – SEGURO DE FIANÇA LOCATÍCIA

Prevista no inciso III, do artigo 37 da Lei de Locações, de todas as garantias esta é a garantia mais segura e efetiva para prevenir riscos de inadimplemento do locatário, vez que a instituição financeira ou empresa de seguro, que será a seguradora responsável pelo pagamento das indenizações ao locador, caso o locatário não cumpra com o adimplemento dos débitos inerentes ao contrato de locação.

Nesta modalidade é feito um contrato de seguro com o banco ou empresa seguradora, cujo prazo é o mesmo do contrato de locação e o segurado é locador.

A legislação que trata sobre seguro é o Código Civil em seus artigos 757 a 777, e especificamente, seguro de fiança locatícia, a Resolução 202/2008 do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP).

A Resolução 202/2008 em seu artigo primeiro conceitua seguro de fiança locatícia e em seu artigo segundo define as partes contratantes: o segurado, seguradora, garantido, estipulante.

De acordo com a referida Resolução é vedada a contratação de mais de um seguro para cobrir o mesmo contrato de locação.

Essa modalidade é excelente para o locador, que não precisa se preocupar com eventual inadimplemento, pois o pagamento é garantido por uma instituição ou seguradora, que assume o risco e fica com o direito de regresso em face do locatário, inclusive, acionar judicialmente o locatário para pagar.

No entanto, alguns locatários podem ter dificuldade de conseguirem essa garantia, vez que as instituições financeiras e seguradoras realizam a análise de perfil do locatário para aprovar o seguro de fiança locatícia em favor do mesmo e outra desvantagem é que o dinheiro do seguro de fiança não retorna para o locatário ao final da locação. Porém, as vantagens para o locatário, dependendo do seguro contrato pode abranger outros serviços como chaveiro, encanamento, eletricista e outros.

Diante da dificuldade de encontrar pessoas naturais para se colocarem como fiadores, a garantia de seguro de fiança locatícia é a alternativa que mais cresce no mercado imobiliário e fomenta o surgimento de empresas de seguro que criam pacotes diversificados de seguros.

Um exemplo que entendo ser espécie da modalidade de seguro de fiança locatícia é a Carta Fiança, um documento denominado “carta fiança”, em que uma Instituição Financeira ou afiançadora ou seguradora ou a empresa que o locatário trabalha que assume o pagamento do débito locatício, caso o locatário venha a inadimplir. Esta garantia é mais utilizada por funcionários que irão morar fora em razão do trabalho e as instituições ou empresas fornecem esse documento.

 

4 – CESSÃO FIDUCIÁRIA DE QUOTAS DE FUNDOS DE INVESTIMENTO

Prevista no inciso IV, do artigo 37 da Lei de Locações. Nesta quarta modalidade de garantia, o locatário ou uma terceira pessoa irá garantir o contrato de locação transferindo a titularidade de quotas de determinado fundo de investimento, ou seja, é a transferência de frações do valor do patrimônio do fundo pelo prazo da locação.

A transferência das quotas ou cotas é formalizado mediante registro perante o administrador do fundo, pelo titular das quotas, por meio de termo de cessão fiduciária acompanhado de 1 (uma) via do contrato de locação, constituindo, em favor do credor fiduciário (locador), propriedade resolúvel das quotas, ou seja, as cotas ficarão indisponíveis (o locatário ou terceiro que cedeu não poderão modificar ou resgatar o investimento), inalienáveis (o locatário ou terceiro que cedeu as cotas não poderão utilizá-las para garantir outros negócios) e impenhoráveis (não poderá ser penhorado para garantir outras dívidas do locatário ou terceiro cedente).

A garantia de cessão de quotas é regulamentada pela Lei 11.196 de 21 de novembro de 2005 e Comissão de Valores Imobiliários através da Instrução CVM 432 de 01 de junho de 2006, que dispõe sobre a constituição, a administração, o funcionamento dos fundos de investimento destinados à garantia de locação imobiliária e a cessão fiduciária, em garantia de locação imobiliária, de cotas de emissão de outros fundos de investimento.

A cessão de quotas é uma garantia de “risco”, pois o valor do patrimônio da fração (cota) pode oscilar e não cobrir a dívida locatícia, mas também pode ter um valor acima de três vezes o aluguel.

Por todo o exposto, a escolha da melhor garantia vai depender muito da condição financeira do locatário.

 

Duas ressalvas importantes!

Primeira: caso o caucionante, fiador ou cessionário de quotas sejam casados, os cônjuges também devem assinar o contrato de locação, exceto se casados em regime de separação total de bens.

Segunda: pela interpretação literal do parágrafo único do artigo 37 da Lei de locações, extrai-se que a vedação é da cobrança de mais de uma modalidade, bom a lei apresenta apenas quatro modalidades. No entanto, não proíbe a cobrança de mais de uma garantia da mesma modalidade.

Dessa forma, para exemplificar não pode ser cobrado no mesmo contrato de locação a caução de um bem imóvel mais um fiador, pois a lei permite apenas uma modalidade de garantia, ou caução ou fiança ou seguro de fiança ou cessão de quotas de investimento.

Porém, o texto da lei não proíbe a cobrança de mais de uma garantia da mesma modalidade, então seria possível, por exemplo, na fiança cobrar mais de dois fiadores no mesmo contrato, pois é apenas uma modalidade de garantia. Outro exemplo seria o caso de caução de bem móvel, em que poderia cobrar dois carros como garantia.

A exceção seria do seguro de fiança locatícia, que conforme artigo 4º da Resolução 202/2008 do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) é proibido a contratação de mais de um seguro para cobrir o mesmo contrato de locação.

 

 

Referências:

ARAÚJO JÚNIOR, Gediel Claudino de. Prática de locação: lei do inquilinato anotada, questões práticas, 8. ed., rev., ampl. e atual. – São Paulo: Atlas, 2018.

SOUZA, Sylvio Capanema de. Lei do inquilinato comentada. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012.

GURGEL, Tati. A garantia no contrato de locação. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=nSMlqjrEOfM&ab_channel=TatiGurgel. Acesso em 16/03/2021.

Lei nº 11.196, de 21 de novembro de 2005.

Instrução CVM nº 432, de 1º de junho de 2006. disponível em: http://conteudo.cvm.gov.br/legislacao/instrucoes/inst432.html . Acesso em 16/03/2021.

Portal do Investidor:  Cotas. Disponível em: https://www.investidor.gov.br/menu/Menu_Investidor/fundos_investimentos/cotas.html. Acesso em 16/03/2021.

[i] SOUZA, Sylvio Capanema de. A lei do Inquilinato comentada. p.164.

[ii] SOUZA, Sylvio Capanema de. A lei do Inquilinato comentada. p.37

[iii] Site do STJ, acesso em 25/02/2021. Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/25022021-Para-Terceira-Turma–bem-de-familia-oferecido-como-caucao-em-contrato-de-aluguel-e-impenhoravel.aspx

[iv] Lei 8.009/90 – Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: […] VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

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